Há vinte anos atrás (1993), como que “por acaso”, um emblema do Tai Chi impresso em um pedaço de papel veio parar em minhas mãos e despertou minha curiosidade sobre o seu conteúdo simbólico e sobre o significado de Yin-Yang. Desde então continuo buscando informação e refletindo a respeito do assunto.
Comecei por procurar em livros, na internet e junto a pessoas ao meu alcance que, eventualmente, pudessem me esclarecer sobre a questão e, assim, acabei me deparando com o I Ching, com o Taoismo, com as práticas taoistas e, dentre elas, com o Feng Shui, algo que não sabia exatamente o que seria mas que me cativou, sobretudo, por investigar sobre o Espaço, tema que sempre me interessou.
Assim, fui recolhendo uma miscelânea de informações (muitas vezes contraditórias) sobre Feng Shui, Taoismo e I Ching e aumentando meu desejo de conseguir (literalmente) me Orientar dentro do assunto…
Em 2000 tive o privilégio de conhecer e estudar com Mestre Wu Jyh Cherng [1], sacerdote taoista nascido em Taiwan que falava fluentemente português e vivia no Rio de Janeiro, onde havia fundado a Sociedade Taoista do Brasil com a finalidade de preservar e difundir os ensinamentos do Taoismo Ortodoxo. Ironicamente, depois de “rodar mundo”, tinha encontrado um autêntico Mestre chinês, bem a meu lado…!
Assistia a suas palestras sobre Taoismo e a suas aulas de Zi Wei Dou Shu (Astrologia Polar Chinesa), ao mesmo tempo que acompanhava, com um outro professor, as aulas preparatórias para poder estudar Xuan Kong Fei Xing (Estrelas Voadoras). Em 2001, finalmente, estaria apta a estudar Feng Shui com Mestre Cherng!
O primeiro dia de aula do curso de Xuan Kong Fei Xin foi uma experiência única de que recordo com muita frequência. Pouco depois do início da aula, ainda introduzindo o tema do curso, Mestre Cherng foi interrompido por uma estudante atrasada que tocava insistentemente à campainha para que lhe fosse facultada a entrada. Após interromper mais algumas vezes o seguimento da explanação de Cherng (até finalmente se acomodar e aquietar), na primeira oportunidade que teve dirigiu-se a ele e lhe solicitou que indicasse alguns artigos “que explicassem como o Feng Shui funcionava, em termos científicos, tipo de física quântica, ou algo assim, para que pudesse disponibilizá-los a seus clientes mais reticentes”…
Cherng disse-lhe que a função de consultor de Feng Shui não é a de explicar como funciona o Feng Shui e que, caso o cliente quisesse sabê-lo, teria de se disponibilizar a estudar o assunto, como ela mesma o estava fazendo…
Não demorou muito tempo para que a estudante voltasse a interrompê-lo, desta vez para saber se os alunos daquele curso receberiam algum certificado…
Cherng respondeu que de nada serviria um certificado sobre sua presença em um curso, ao que ela retrucou que o certificado comprovaria que tinha feito o curso e, portanto, atestaria sua aptidão para ser consultora… e emendou que se achava no direito à certidão, inclusive porque o curso era pago…
Mestre Cherng dirigiu-se a ela e lhe adiantou que a Sociedade Taoista poderia, até, atestar sua presença no curso… Daí, até atestar sua aptidão… Para atestar sua aptidão seria preciso, primeiro, ela comprová-la… E para um consultor comprovar sua aptidão, ele precisa… “simplesmente acertar!!!! Acertar o diagnóstico! Acertar as previsões! Acertar nas intervenções a serem feitas! Acertar no grau adequado de interferência no espaço e na vida dos moradores! O consultor pode até ter a técnica e não estar apto. Feng Shui é uma técnica. Saber usá-la é uma arte”.
Foi a partir desse momento que acabou/começou aquela primeira aula! Mestre Cherng não adiantou absolutamente nada sobre a técnica Xuan Kong Fei Xin naquele dia… Mas, em compensação, ouvimos um monólogo brilhante sobre ensino pago e aprendizagem; sobre ciência e Tradição Taoista; sobre iniciação e transmissão de conhecimento e de experiência entre mestre e discípulo na China; sobre retidão, polidez, naturalidade, sinceridade e afetividade; sobre conduta, realização, merecimento pelo saber e aprimoramento pessoal.
Esta primeira aula foi, literalmente, uma aula fundamental!
Ao longo dos anos de prática como consultora de Kan Yu, tenho acertado bastante, mas também tenho errado… É um caminho de evolução… Mas sempre me lembro de tudo o que tive o privilégio de aprender com Mestre Cherng, tanto nas aulas como fora delas mas, sobretudo, ao acompanhar, mesmo que de longe, sua conduta durante a vida e diante da morte.
Muito grata, Mestre!
Maria João Bastos