“O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela.”
Fernando Pessoa,
in O Livro do Desassossego
O Tai Chi é um emblema taoista cujo estudo favorece a compreensão do universo como expressão (visível e invisível) da mutação.
Graficamente, num primeiro olhar, o Tai Chi se apresenta como duas partes estáticas, distintas e simétricas (em forma e cor) que, encaixadas uma na outra, compõem um desenho frequentemente reconhecido como “símbolo do Yin e do Yang”, e que sugere um movimento de rotação.
Se nos debruçarmos mais profundamente sobre a imagem poderemos perceber, no entanto, que existe uma fina linha escura que contorna todo o desenho e que permite o reconhecimento da parte clara (Yang) em relação à parte escura (Yin), revelando graficamente a base única e original subjacente a ambos os aspectos. Esta base representa Wu Chi, o Grande Vazio original que precede o mundo manifestado.
Portanto, no emblema do Tai Chi está representado o Grande Vazio anterior a toda a existência (círculo escuro subjacente), assim como todo o universo manifestado (visível e invisível) sugerido, sinteticamente, através de Yin-Yang – eis a primeira polaridade que o emblema oferece: os denominados Céu Anterior e o Céu Posterior, que representam os estados prévio e posterior à manifestação (visível e invisível) do universo.
Yin-Yang, por sua vez, que se destaca visualmente no emblema do Tai Chi, é um conceito inerente à relação dinâmica de dois aspectos contrastantes e interdependentes, através dos quais é possível classificar as “dez mil coisas” que constituem o universo.
Embora possamos identificar aspectos concretos na natureza que nos permitem evocar qualidades ou características ditas “Yin”, ou ditas “Yang”, essas qualidades ou características são sempre expressão de uma relação Yin-Yang, já que elas existem apenas como contraponto recíproco e dinâmico entre aspectos polarizados de uma mesma unidade (Tai Chi).
Como tal, o emblema do Tai Chi apresenta Yin-Yang como dois aspectos contrastantes em constante transformação, que se interpenetram e se alternam indefinidamente, evoluindo ciclicamente e determinando um ritmo de mutação.
Essa mutação cíclica e ritmada permeia o Universo e o apresenta como uma expressão dinâmica de Yin-Yang em permanente elaboração/transformação reciproca, tal como tão bem o mostra a obra “Mãos que Desenham”, de Escher.
Nesse universo em transformação, revelado no emblema do Tai Chi, existe uma linha sinuosa que flui através das variações Yin-Yang. Essa linha imaginária é a trajetória de infinitos pontos virtuais, transcendências simultaneas de luz-sombra, espaço-tempo, morte-vida, passado-futuro,(…) que evocam a Consciência do Presente, a qual também é expressão do próprio emblema do Tai Chi.
Maria João Bastos